O SAMBA É BRASILEIRO OU ALEMÃO?

No artigo de estréia, quinze dias atrás, citei “a globalização galopante pós-Berlim 1989”. Naquele ano havia caído, morrido e enterrado o famoso e vergonhoso muro, morrendo, com ele, qualquer esperança em escala mundial de uma vida alternativa ao capitalismo desenfreado e pragmático.
Em escala nacional – musical – aquele ano marcou o fim de algumas gravadoras tupiniquins e a fusão/compra de outras pelas gravadoras multinacionais, que mais e mais iam se apossando dos parques fonográficos terceiromundistas. O tal ano marcou, também, em nossa música popular, a decretação do ostracismo do samba, colocado a escanteio, sendo substituído pelo pagode-de-boutique. A única alegria de 1989 no meio sambístico foi proporcionado pelo disco de Paulinho da Viola “Eu canto samba”, que demorou mais de sete anos para chegar aos nossos ouvidos, devido à “preferência” jabaística pelo novo batuque-de-boutique.
A coletividade do samba procurava saber sobre os novos discos de Beth Carvalho, João Nogueira, Martinho da Vila, Germano Mathias, Demônios da Garoa, Roberto Ribeiro, e a resposta vinha com o silêncio midiático, mesmo porque não havia nenhuma previsão de gravação de discos desses bambas. O costume de irmos às lojas procurarmos pelos então “cebolões” também tinha sido encaminhado ao ostracismo. Dermeval Miranda Maciel – o grande Roberto Ribeiro – foi um dos que mais sentiu o distanciamento de seu público, pois estava no auge de sua carreira e, de repente, não mais que de repente, se viu sem contrato e sem projeto de um novo disco, sem maiores explicações. Entrou em crise depressiva, entrou para os amigos do álcool, saiu de cena, muito triste seu fim.
Um pai ou uma mãe, casados após 1989, e felizes com os primeiros aniversários de seus filhos, ao procurarem fundo musical para animar a festa não encontravam novidades do samba nas prateleiras, e, sem opção e atenção,   começaram a substitui-los pelos pagodes-de-boutique (não confundir aqui com o “pagode” do Grupo Fundo de Quintal, que cantava samba verdadeiro até este fatídico ano, o qual marca também o início de seu declínio).
1989, enfim, marca o nascimento de “um novo samba”, que ganhou berço nas conseqüências da derrubada do Muro de Berlim. Este “novo samba” – o pagode-de-boutique – afinal, é brasileiro ou alemão?


publicação original do Jornal Tribuna Impressa e portal Araraquara.com dia 02/09/2010