O Samba já chorava pela natureza


Muitos compositores, de muitas vertentes da MPB, cantaram, cantam e continuarão a cantar a nossa mãe natureza. Eu, como a grande maioria da população brasileira, estupefatos perante as tristes cenas proporcionadas por mais um verão, confesso que de imediato veio à minha mente duas canções, na verdade dois sambas, oriundos da riquíssima lavra dos parceiros João Nogueira e Paulo César Pinheiro, nascidos ao final da década de 1970, portanto, visionários, uma trezena de anos depois. O primeiro samba, que ecoa e ressoa sem cessar é Chorando pela Natureza, em cujos versos iniciais já se define: “A natureza está clamando/De tanto lutar não resistiu/E a poesia está chorando/Sobre o corpo do Brasil…”.
A cada verão que vivenciamos, essa canção me chega assombrando os sonhos, as alvoradas, porque o panorama é sempre o mesmo: o descaso das autoridades no que tange a proporcionar aos seus cidadãos o uso e ocupação do solo mais racionalmente, a desgraça dos menos providos financeiramente que acabam se alojando nas encostas e antigas várzeas de rios, pontos nevrálgicos de um já muito desequilibrado ecossistema e chuvas acima da média devido ao aquecimento global, que os senhores do poder insistem em empurrar com a barriga metas reais e contundentes para se tentar aliviar a fúria da mãe natureza, cansada de tanta exploração que visa única e exclusivamente o acúmulo e concentração de riqueza monetária, alardeada pelos quatro cantos do planeta como visão desenvolvimentista, que gera emprego e renda, independente de mais nada…
O segundo samba se intitula As Forças da Natureza, que, em sua primeira estrofe, já dá o tom: “Quando o sol se derramar em toda a sua essência/desafiando o poder da ciência/pra combater o mal/ e o mar com suas águas bravias/levar consigo o pó dos nossos dias/vai ser um bom sinal…”. Como engenheiro, fico aqui pensando em que modelo hidrológico deveremos nos basear daqui pra frente, a julgar as cenas seqüenciais de Santa Catarina, de Alagoas/Pernambuco e agora da Serra Fluminense… O que a engenharia poderá fazer, a não ser criar/efetivar um sistema de alarme para evitar mais desgraça? Porque a desgraça virá, já que a Natureza está chorando, literalmente, com suas chuvas torrenciais, que não nos deixam dúvida alguma, estão chorando sobre o corpo do planeta.

publicação original do Jornal Tribuna Impressa e portal Araraquara.com
dia 20/01/2011