Antes de D. Pedro I subir em seu cavalo e
proclamar a independência de Portugal – e a dependência da Inglaterra,
que logo a seguir aportou em nossa costa descarregando o excedente da
sua produção metálica oriunda da Revolução Industrial e fez inaugurar,
assim, nossa dívida externa – a música que rolava no Brasil colonial se
resumia aos cânticos sacros divulgados nas igrejas e as chulas e cantos
de trabalho do operariado, serviçais básicos e escravos africanos.
Num primeiro momento, o panorama territorial pouco
mudou, mesmo porque o ato ocorrido às margens do Riacho Ipiranga não
contou com aclamação popular, que, aliás, de popular nada teve; com o
passar do tempo, e assim que seu substituto de trono D.Pedro II deixou a
tutorialidade dos Andrada e Silva, já na segunda metade do século 19,
este, um apreciador da vida boêmia que aprendera a admirar em seus
passeios de férias pela Europa Central, inaugura, como um agitador
cultural, o intercâmbio musical no Brasil, trazendo em viagens pioneiras
as companhias musicais belgas, alemãs, francesas – depois do fim da era
Bonaparte – que efervesciam por lá, praticando o schottish, a polca, a
mazurca, o tango e outros ritmos da época, propiciando o contato da
incipiente classe média da capital federal – Rio de Janeiro – com
instrumentos pouco conhecidos até então, como a flauta transversal e
outros sopros; a reboque dessa ação – historiadores falam em 1.854 –
pouco tempo depois surgem os primeiros músicos “chorões”, registrando,
através de Joaquim Callado, uma nova forma de tocar a flauta recém
chegada, pontuando em 1.870 com a belíssima “Flor Amorosa”,
caracterizando o que hoje conhecemos como o gênero Chorinho.
Virou-se o século 19 e, no limiar do novo século 20,
surgem as primeiras corporações musicais ligadas às instituições
públicas como o Corpo de Bombeiros, Marinha e Exército, destacando-se
nesse período o lendário maestro Anacleto de Medeiros e seus dobrados;
em 1.917, logo ali à frente, veio, após a instalação das primeiras
gravadoras de acetato como a Casa Edison, a gravação de um maxixe que se
convencionou chamar de samba, intitulado “Pelo Telefone”, de
Donga/Mauro de Almeida e outros anônimos que viviam no quintal da casa
de Tia Ciata, arredores da zona portuária carioca; samba, mesmo, em
compasso binário como hoje conhecemos só se traduz em 1.928 com os
bambas da Deixa Falar – primeira escola de samba do país – do Largo do
Estácio, como Bide, Ismael Silva e Marçal.
Seguindo a linha do tempo, e
com o cinema falado debutando na década de 1.930, a incontrolável
influência norte-americana firma suas bandeiras em nossa tropicália,
servindo até de inspiração para um clássico samba do maior cronista
musical de nossa história, Noel Rosa, chamado “Não tem tradução”, em
1.933, onde ele ironiza o esforço do nativo alienado em tentar
reproduzir o novo modismo que vinha da terra do Tio Sam; em 1.936 é
criada a Rádio Nacional por Getúlio Vargas, um instrumento de difusão
perfeito para se preparar a sua fase ditatorial com o Estado Novo de
1.937, o qual, demagogicamente – e neste caso favoravelmente às raízes
musicais nativas – serve para se constituírem os primeiros ídolos da
música nacional, como Francisco Alves, Orlando Silva e vários grupos
musicais como o Demônios da Garoa e os Cariocas, década de 1.940, era de
ouro do rádio.
Em 1.950 surge a televisão, ainda engatinhando mas já
incomodando o trono ocupado pelo radialismo, cuja troca de posições se
deu ao final de 1.960, junto com a Era dos Festivais – da Record e
Excelsior – que nos legou grandes nomes como Milton Nascimento, Elis
Regina e Paulinho da Viola; paralelamente, oficializa-se a primeira
junção da nossa música com o influente jazz norte-americano, forjando a
bossa nova. Em seguida, os anos 70 dos porões da ditadura militar mas
ainda sem a ditadura cultural comandada pelas grandes gravadoras
multinacionais, que semearam os anistiados anos 1.980 para, a partir de
1.990, mostrarem suas verdadeiras garras e tomarem conta do terreno,
impondo os ritmos e sucessos que bem quiserem, como o pagode, o axé, o
sertanejo universitário, o funk, contando com a alienação galopante
multiplicada pela baixa qualidade do ensino massificado e a desatenção e
despreparo dos pais e mães das famílias, que saem de casa pra trabalhar
e cada vez mais saem da função primordial de co-educar seus filhos,
atualmente mergulhados na vida virtual dos celulares, tablets e redes
sociais…Independência ou Morte, gritara o nobre imperador…Hoje, como
gritaríamos? Paciência e Muita Sorte, disse-me outro dia um amigo, para
não ouvir as músicas que poluem os ares de nossa pátria amada...