Zuleide, Givanilda, Gilvaneide,
Genilda, Genileide, Josenilda e José Amaro. Do interior de Pernambuco para o
interior de São Paulo, mais especificamente, para Araraquara. Pessoas do bem,
dignas, trabalhadeiras, deixaram sua Barreiros – a contragosto – para tentarem
a sorte no sudeste maravilha, conseguirem emprego e sobreviverem.
É a eterna história de milhares
de nordestinos se repetindo, conforme poderia ser anexada a mesma aos relatos
de “Vida e morte no sertão”, do historiador Marco Antonio Villa, retratando as
secas do nordeste nos séculos XIX e XX. Mas Barreiros não se localiza exatamente no Sertão, beira o litoral sul
pernambucano, próximo de praias paradisíacas como Perobas e São José da Coroa
Grande, lazer garantido, mas sem dinheiro pra esse lazer.
Apesar das milhares de promessas
dos governantes locais em períodos eleitorais para as “mudanças” – aliás,
proponho aqui que se extermine o verbo,
paradoxal, mudar, de nosso vocabulário, pois o ser humano, majoritariamente,
não é adepto a elas, as mudanças – através das quais os nordestinos iriam ter
vida digna, apoio estatal para a produção e consumo local, incentivos de Sudene
e outros órgãos afins para que não precisassem mais exercitarem seu dom
migrante , mas o que se assiste, eleição a eleição, é uma reprodução barata, cruel e irresponsável dos executivos eleitos,
que, pelo contrário, fazem da seca e enchentes um palanque eterno, desumano,
sem final feliz para quem não é da camarilha.
Das pessoas citadas na abertura
deste texto, conheço bem duas delas, a Gilvaneide – que veio primeiro – e a
Givanilda, que chegou depois, motivada pela primeira que conseguiu se
estabelecer por aqui, inclusive se casou e já tem filha araraquarense. Pessoas
honestas e inteligentes, que tiveram pouca chance de estudar pois começaram a
trabalhar muito cedo, mas que se superaram e se adaptaram às novas condições de
sobrevivência (desconheciam casacos e
cobertores, por Barreiros isso não se usa).
E assim se sucedeu, todos os
irmãos e irmãs já estão por aqui – só o pai, muito idoso, ficou por lá – o
último a chegar foi o caçula José Amaro, dois meses atrás. Sitiante iletrado,
cultivava feijão, mandioca, amendoim, entre outras culturas, e tendo a ajuda da
esposa e de seus sete filhos batalhou por lá anos a fio na lavoura, até
desistir, vender o velho automóvel que usava para escoar sua produção, para
poder comprar as passagens para nove e desbravar o sudeste araraquarense.
Logo que chegou pegou o frio
inesperado do último Agosto, tomou seu primeiro susto, fora os hábitos
alimentares completamente distintos dos praticados por lá. Mudança forçada, o
ser humano não é adepto a mudanças, estamos lembrados. Ao saber de sua história
contada pela mana Givanilda, veio-me à memória uma música do saudoso compositor
mineiro de Uberaba, Antonio Carlos de Brito, o Cacaso, intitulada “Ave de
arribação”.
Em seu sentido primordial, ave
de arribação é espécie de “ave migratória, que durante o inverno voa para
lugares mais quentes, retornando às origens quando o tempo por lá esquentar”.
Não, não cola na história deles, eles não retornarão pra lá, nada a ver…
Já nos versos do craque
compositor, lemos: “(…)ave de arribação/asas da imensidão/asas de um
sonhador”. Sim, a letra tem a ver com a história, eles não retornam, mas ainda
sonham, inclusive, em voltar para o quente nordeste, como arribaçã… Tudo a
ver, triste realidade…