COLOQUEM OS SAPATINHOS NA JANELA

Escrevo em plena alvorada do cabalístico 12 do 12 de 2012, direto da concentração que antecede ao jogo do Corínthians lá no país do sol poente, pois pelos  fusos horários a mais o astro rei por lá já se deitou e convidou a lua – e a neve prevista, novo ingrediente de superação no caminho – para focalizar outro capítulo da saga dos seguidores de São Jorge.
Como estamos no mês do Natal, obedecendo as tradições, não só os corinthianos –  que certamente, em massa, pediram de presente ao bom velhinho o título do Mundial de Clubes – mas todos os brasileiros, seguimos o ritual de aproveitar a data para reflexões por dias melhores e considerações sobre o que mudar visando a perspectiva do 2013 que está chegando.
No cenário de fundo gravado pela memória que nestas horas não falha, insistentemente aparece uma certa propaganda lendária na qual o Papai Noel, singrando os céus do planeta com sua carruagem de renas, estaciona ao lado de uma grande e altiva chaminé, por onde, em questão de segundos, desce em queda livre para ganhar o interior de uma casa, sobrecarregado pelo saco de presentes às suas costas.
Como aqui no Brasil as chaminés caseiras não ocorrem em profusão para combater o frio tal nos países do entorno do Trópico de Câncer, e aliado ao fato de que a maioria dos Noéis estarem associados a senhores mais rechonchudos e de idade avançada, houve-se por bem fazer uma adaptação, pelos publicitários, dessa cena, a qual se derivou para algo menos fantasioso tipo se omitir as renas e, de sopetão, a sombra da figura de roupa e gorro vermelhos aparecendo e depositando os tão esperados presentes por sobre sapatinhos apoiados no caixilho das janelas abertas em noite não friorenta dos nossos verões. 
Essa adaptação, rodada e captada por nosso imaginário nos idos da década de 1.970, convenhamos, poderia ser mais aprofundada, já que colocar gorro e capa de tecido impermeável é atitude meio masoquista, considerando as altas temperaturas que estamos acostumados a vivenciar, inclusive nas noites e madrugadas de Dezembro; além das vestes, e aí, se trouxermos a cena para os dias atuais, nem a mais fértil mente da garotada poderia a ela dar credibilidade, já que, para as famílias de rendas mais altas, os sistemas de segurança que contemplam pacotes nos quais se incluem vigilância por vinte e quatro horas, cerca elétrica e câmeras bisbilhoteiras, não permitiriam a aproximação do Natalino para perto das janelas e, para as famílias de rendas mais baixas, os sistemas de insegurança que contemplam pacotes nos quais se incluem convivência por vinte e quatro horas com a bandidagem, toque de recolher ao escurecer e tiroteios até romper a aurora, por certo inviabilizariam o depósito dos mimos nas janelas, que obviamente permaneceriam fechadas.
Para, talvez, não perder o clima de fantasia que a época nos impele, e, também, se aproximar da nossa realidade vigente abaixo da Linha do Equador tropicaliente, imagino que a saída fosse, todos nós, aproveitarmos a linguagem da comunicação dominante e mergulharmos em nossos computadores, contratando um webdesigner (acho que é assim que se escreve) o qual, particularmente, criaria um filme o qual reuniria gloriosamente a família na sala e que daria vazão nas telas – dos próprios computadores ou tornaria refém, por instantes, as TVs de plasma HD de grandes dimensões durante a ceia de Natal, no crepúsculo da Missa do Galo – recriando a cena do Papai Noel depositando os presentes nos sapatinhos das janelas, cujos donos dos sapatos se identificariam individualmente através de login e senhas respectivas para poderem, os presentes, serem retirados a partir do dia 26 nas lojas virtuais conveniadas ao evento.
Estaria resolvida a saia justa dos Papais Noéis, que não precisariam se arriscar nas descidas em queda livre e se livrariam do possível constrangimento de se entalar nas chaminés, muito menos correrem risco de se aproximar das janelas da vida vigiadas, e, por consequência, estaria resolvido e plenamente adaptado para a linguagem de nossas crianças – de berço, já cibernéticas – o novo cenário, se bem que virtual. A família, unida, protegida, a champagne estourando (e abafando eventuais tiroteios do lado de fora), a alegria desmedida da Noite de Natal…Podem colocar seus sapatinhos nas janelas, virtuais, e “Jingle Bells”…