FIQUE DE OLHO NO APITO

O verso acima pertence a um famoso e belo samba que se intitula “Camisa suada”, composição do grande Carlinhos Vergueiro, corinthiano de quatro costados, mas que, obviamente, pode ser transportado e empregado por qualquer torcedor aficcionado deste país, de time grande, médio ou pequeno, time varzeano ou torcedor praticante de campeonato de futebol de botão, um dos entretenimentos mais comuns em minha – e de muitos amigos – infância e adolescência, hoje quase esquecido.
O juiz, personagem central enfocado nesta crônica musical, é um ser humano e, portanto, passível de acertos e erros, estes últimos, se oriundos da consciência do apitador, de forma alguma poderiam ser suportados : “não deixe barato/ele é igual a você e não pode roubar”  ressalta o compositor, com o qual concordamos integralmente.
Carlinhos Vergueiro, meu amigo da época do projeto Boteco do Cabral do Sesc, poderia, para os dias atuais do nosso futebol, rascunhar algumas linhas a fim de trazer à tona outro personagem muito importante dessa seara – e aproveitar para tirar do calvário o árbitro, sempre o primeiro culpado para qualquer derrota, dentro de nossa cultura futebolística – que seria o “cartola” dos clubes, já que, devido ao esporte ter se tornado um grande negócio, hoje ele seria identificado pelos poucos e ainda apaixonados diretores e/ou os empresários e intermediários donos dos passes dos jogadores, que procuram os clubes vitrines para exporem seus “produtos”, os próprios jogadores.
Escrevo estas linhas (des)motivado pelo novo sufoco pelo qual passou a nossa Ferroviária – seja a Associação de Esportes ou a S.A. – para se manter na segunda divisão, já que, para nós, apaixonados pela camisa grená de tantas glórias, integralizaram-se dezessete anos fora da divisão primeira do futebol paulista. A realidade dos campeonatos mudou e muito, os times não mais conseguem ter estrutura financeira para montarem suas categorias de base – as quais sempre funcionaram como celeiros reveladores de craques, como aqui “nasceram” para o futebol o Dudu, o Bazanni, o Nei, o Lance, o Pio, o Téia, o Douglas Onça, o Wilson Carrasco e muitos outros mais – bem como a duração desses campeonatos é minúscula, pouco mais de três meses e eles se findam, induzindo muitos clubes a interromperem e só retomarem suas atividades seis meses depois, para a remontagem do time, fato este que acaba gerando um círculo vicioso e perverso, no qual não se apuram as qualidades dos sempre novos jogadores a compor o novo elenco.
E assim vai, com a Federação Paulista de Futebol cada vez mais rica e política – seu presidente se eternizando no poder (como na CBF, como na Comenbol, como na FIFA, afinal, o futebol é também um produto globalizado) – os clubes cada vez mais pobres e reféns desse outro círculo vicioso e perverso, tendo como subproduto maior o cada vez mais notável afastamento dos torcedores, descrentes de posicionamentos e encaminhamentos que modifiquem essa roda-viva que nos leva, ano a ano, a cair pelas tabelas do ranking mundial da categoria.
Carlinhos Vergueiro, meu amigo, você poderia começar essa canção – sei lá, de protesto, com ironia ou brejeirice, do jeito que achar melhor – com a idéia de que nem há mais necessidade de torcida no novo status do futebol brasileiro, haja vista o Red Bull e o Audax, que pagam pessoas para torcerem(?) pelas suas cores, e não se esqueça do Barueri, que virou Grêmio Prudente e voltou a ser Barueri, ou do Guaratinguetá, que virou Americana e voltou pro Vale do Paraíba; talvez, num formato de samba, com a sua malemolência que o caracteriza, o torcedor mais humilde enxergue essas manobras e, de repente, crie movimentos – até pelas redes sociais, modismo de nossos tempos – de se mobilizar em prol de uma guinada de 180 graus nos rumos do nosso futebol, para que um dia, quem sabe, volte aos estádios e volte a fazer sentido o sofrimento que passamos no domingo, com as bênçãos de São Capivariano. Fique de olho no cartola, torcedor!!!