Ano passado escrevi uma coluna sobre o Dia Nacional do Samba, por
isso relutei em escrever sobre o mesmo tema, bem hoje, quando o trem da
Central do Brasil avança pelos subúrbios cariocas para celebrar a data.
Não falarei novamente sobre a origem da efeméride, mesmo porque há
espaço para variadas e valiosas reflexões recorrentes. Uma delas, sem
dúvida, é focalizar o samba como manifestação cultural genuína, sem
cópias, sem “globalismos localizados” ou “localismos globalizados”, como
diria o sociólogo português Boaventura de Souza Santos.
Digo isso por que, ao procurarmos notícias sobre a programação relativa a
esta data, leio que haverá, por exemplo, em São Paulo, um passeio de
trem com batuqueiros a bordo, entre outras variadas rodas…É bem esse o
exemplo de um localismo globalizado, onde um evento que faz sentido no
lugar onde nasceu – no caso, nos subúrbios cariocas da zona norte –
acaba por ser “exportado” para outros lugares, como, no caso, São Paulo;
via de regra, muito em breve, alguém, de outra capital ou cidade
qualquer – se isso já não estiver acontecendo agora – irá transportar a
idéia e, obedecendo a logística mercadológica dos dias atuais, tentará
se aproveitar do fato para auferir visibilidade e, num segundo momento,
lucro.
E é nessa sutil linha fronteiriça que a manifestação legítima cultural
se transforma em produto cultural, caso não prevaleça o bom senso, a
ótica reverente e o legado de se agregar as novas gerações sem deturpar
as velhas tradições.
Não sei se há o Dia Nacional do Forró ou o Dia Nacional da Bossa Nova ,
sei que existe o Dia Nacional do Chorinho – coincide com o dia do
nascimento de Pixinguinha, homenagem mais do que merecida e consistente.
Independente de haver ou não datas específicas, o que importaria, para a
cultura musical brasileira, seria uma atuação
diferenciada do Ministério da Cultura, hoje comandado pela Ana de
Hollanda Irmã do Chico Buarque, no sentido de se conclamar reuniões com
emissoras abertas de rádio e TV – mídias diretas que atingem a maior
parte da população brasileira – a fim de se exigir que as mesmas
tivessem que reproduzir em suas programações corriqueiras um mesmo tempo
de exposição para todos os gêneros musicais, e não só o pagode, o axé, o
sertanejo, o funk que monopolizam devido ao tão conhecido jabá…
Utopia, Thomas Morus, não é, Nandão?…Pode até ser, mas que poderia fazer
a diferença, já que o jovem de hoje não fica exposto a todos os gêneros
brazucas e, em sua adolescência, quando não se identifica com nenhuma
dessas categorias nacionais jabaculeizadas citadas acima, vai atrás de
uma guitarra e abraça o rock/pop, como a outra opção, não nacional, que
está nas paradas. Está na hora de se pensar alternativas, e não,
simplesmente, se recriar trens por aí, mesmo porque as ferrovias estão
na contramão da história. A internet pode ser esse novo trilho dos
tempos …
publicação original do Jornal Tribuna Impressa e portal Araraquara.com
dia 02/12/2011