O bom baiano Dorival Caymmi, que aliás aniversaria (no presente,
pois é eterno pelo conjunto de sua obra) ao final de Abril no dia 30 (na
verdade nasceu em primeiro de Maio, dia do trabalho, mas contrariando a
lenda, por lá também é feriado e os cartórios estavam fechados), já
cantava e convidava nos idos de 1950 “Você já foi à Bahia?”. Estado de
graça, Salvador a primeira capital federal, maior e uma dos mais belas
costas litorâneas do país, hoje nem necessita de marketing para atrair
novos turistas…
O bom sergipano Luis Americano, exímio clarinetista,
ao que me lembre, não compôs nenhum choro para homenagear Aracaju, a
maravilhosa capital do menor estado brasileiro; outro ilustre sergipano,
o monumental trombonista Zé da Velha, ao que tenha presenciado e
ouvido, nunca soprou um choro de gafieira com algum título que nos
remeta à “morada dos cajueiros”. Dono de um litoral magnífico, orla
urbana totalmente remodelada e com inúmeros equipamentos esportivos,
sociais e educacionais, Aracaju é sem dúvida uma cidade modelo, com a
maior ciclovia do país, mas, por incrível que pareça, não dispõe de uma
estratégia de marketing que atraia novos turistas. Talvez minha
interpretação seja errônea, talvez sejam as outras capitais nordestinas
que tenham marqueteiros propagandeando muito mais do que a realidade
mostra…
De qualquer forma, estando em Aracaju – que aliás
recomendo a todos que desejem ver com seus próprios olhos um esboço de
cidade da qual seus cidadãos podem se orgulhar – não deixe de visitar a
barraquinha de número 9 da Praia de Aruana, a qual é gerenciada pelo
“seo” Agnaldo de França Lemos, que atende pelo apelido de Libório. Há
vinte e três anos tira seu ganha-pão dali, entre pastéis de aratu,
robalos ao molho de camarão e samba da melhor qualidade…
Samba em Aracaju???, perguntaria espantada a querida
Neusinha, irmã de Pedro Paulo Der Spiegel, o Espiga dos óculos de
solda…Pois é, mais uma surpresa bem-vinda, num domingo de sol que
caminhava para a melancolia, haja vista que a prática dos habitantes
dali é encostar seus carros nas vagas da orla, com o porta-malas virado
para o mar, e tascar no último volume a mais nova obra prima do Grupo
Pissirico (não há este verbete no dicionário, portanto desconheço o
significado da palavra, quem souber escreva para a redação). Confesso
que tive que mudar de coqueiro umas três vezes e já estava desistindo,
quando descobri o bar do Libório…
De começo, CD integral de Paulinho da Viola. Emendando
com o regional do maestro Saraiva e seus choros belíssimos com direito a
solos de acordeon, pra depois emendar com Roberto Ribeiro. Finquei as
cadeiras por ali, debaixo da sombra do próprio avancé do bar, brindando
ao mar limpo e calmo e à brisa infinda da capital sergipana. Fizemos
amizade rapidamente, e, rapidamente, ele se identificou como um cantor e
escritor e, mais que isso, um batalhador da boa MPB, ao me contar que
no dia anterior um sujeito havia chegado em seu pedaço, encostado sua
caminhonete último tipo e, depois de umas doses – e apesar de estar
ouvindo Angela Maria ao pé da caixa de som virada pro mar – se dirigiu a
ele com o pedido de se desligar o som para que o visitante colocasse o
turbinado Cd do Calcinha Preta do palco de seu porta-malas…
Final da história, o sujeito foi convidado a se retirar
do local, resignado e bronqueado com a reação do Libório, o qual, em
nossa despedida, me confessara que a única coisa da qual ele se
envergonha da capital sergipana é a prática da MPSB – música para surdo
brasileira, já que bate uns cento e cinqüenta decibéis os ruídos dos
porta-malas – um verdadeiro “caso de polícia”, pois, segundo ele, o
certo seria os policiais abordarem os portamaleiros-do-som-pra-surdo com
“galão de gasolina e fósforo”(sic)…Um viva pro Libório, defensor da
nossa MPB…