O Sucesso e o Samba

Qualquer manifestação artística envolve público afim e o respectivo artista. Seja no teatro, na dança, na pintura e, claro, na musa das artes – daí seu nome – a música. A relação biunívoca que surge a partir da exposição do artista ao público depende, obviamente, do intermediário que os une, no caso a mídia, seja ela escrita, falada, televisada ou, mais contemporaneamente, plugada, via internet.
No caso da música – e em tempos de dominação midiática pelas grandes corporações do ramo das comunicações – o público alvo é, normalmente, induzido a idolatrar aqueles que essa indústria, por algum motivo – principalmente lucro fácil – elege como “bolas da vez”.
Na sociedade do espetáculo de hoje – que se renova, via de regra, esteticamente (exteticamente seria a grafia original, pois se valoriza o externo, a fachada) – um rosto bonito, corpo malhado e talhado principalmente pelo milagroso silicone, são os pontos cruciais, requisitos fundamentais para que, no caso da música, novos e novas intérpretes se habilitem ao cargo de “bolas da vez”. Seja no âmbito internacional ou nacional, o que vemos é um desfile de pessoas que cumprem esses requisitos para se tornarem os ícones. Cito os intérpretes como os expoentes, já que os compositores são normalmente ignorados, mesmo porque estariam trabalhando na outra ponta da tabela, que seria a ética do segmento musical, onde se procura valorizar o interno, o conteúdo.
Imaginem se, por um azar das maternidades, Vinícius de Moraes, Tom Jobim ou Nelson Cavaquinho – que completa cem anos de imortalidade neste 2.011 – tivessem vindo ao mundo musical brasileiro nesta década. Muito provavelmente seriam ignorados, colocados num segundo plano, pois a essência da música não está mais em jogo, o que vale é o entretenimento que ela provoca.
Assim sendo, aqueles que se lançaram ao mundo da música cultuando-a através de sua ética se vêem, muito frequentemente, ao longo de suas carreiras, numa verdadeira sinuca de bico. Mantendo suas posturas, performances e convicções, vão, no máximo, ser citados pela ínfima minoria que compõe o público “consumidor” como referências eternas e jamais atingirão o sucesso na carreira, entendido aqui sucesso como o sinônimo que a mídia nos impulsiona, ou seja, recordistas de vendas e de pirataria em seus CDs; por outro lado, ao se cansarem de não atingirem esse padrão de sucesso e, por extensão, de “reconhecimento monetário”, podem, eles próprios, passarem por uma “repaginada” (termo atual, tá na moda) e, de repente, mudarem em cento e oitenta graus a proposta musical de suas carreiras.
Esse tipo de repaginagem ocorre com freqüência, inclusive no samba. Sambistas que foram considerados grandes intérpretes e compositores no início de suas carreiras, em não atingindo o “sucesso” almejado, mudaram completamente de rumo. Não vale a pena citar nomes, talvez não coubesse numa única lauda. Talvez valesse discutir o que é o sucesso neste mundo passageiro em que vivemos. Mas isto daria uma outra coluna.

publicação original do Jornal Tribuna Impressa e portal Araraquara.com
dia 04/11/2011