O Carnaval é a festa mais celebrada pelo povo brasileiro. Emendam-se
dias de folia, pontos facultativos se transformam em feriados
prolongados, patrões se misturam aos seus funcionários sintonizados no
mesmo “bumbumpraticumbumprogurundum” idealizado pelo imperiano Aluísio
Machado.
Festa pagã liberada a partir do calendário
religioso, o Carnaval se emancipou a partir de blocos de sujos, batalhas
de confete e do lendário Zé Pereira com seus bumbos de lata e limões de
cheiro pelas ruas das cidades, ambientes abertos; paralelamente, nos
ambientes fechados das grandes sociedades, bailes de máscaras tratavam
de travestir o evento nos moldes dos protagonistas do cotidiano,
liberando as avenidas para os coadjuvantes da cadeia capitalista poderem
ter seus momentos de bota-fora.
Com o passar dos tempos, os carnavais dos
ambientes fechados perdem seu glamour, a celebrização da sociedade do
espetáculo exige uma nova formatação da festa do Momo, a mídia percebe
que a quantidade determina a preferência. Os até então quase anônimos
foliões das passarelas do asfalto – obviamente que iria sobrar pra eles,
coadjuvantes por definição – são pegos de surpresa e, a partir de um
discurso elitista no qual os desfiles carnavalescos podem se tornar
verdadeiras óperas ambulantes, coreógrafos de plantão e oportunistas em
geral chamam para si as luzes da ribalta, ditando as novas cátedras do
folguedo, fazendo caras e bocas tortas para as tradições, já que foram
nomeados os grandes protagonistas do novo show.
Parafraseando o amigo Miguel de Lorenzo, “tudo
muda”, a sociedade sempre inquieta exige “novidades”, já que é muito
mais fácil se fazer uma mudança de fora para dentro (portanto,
ex-tética) do que uma mudança de dentro para fora (portanto, ética).
Aqui no Sudeste, de uma hora para outra, as marchinhas e os sambas de
enredo memoráveis são simplesmente banidos da festa. Em seus meritórios
lugares surgem os descartáveis “hits” da axé-music – com bordões que
fariam Carlos Drummond de Andrade repensar de seu túmulo toda sua obra, a
partir da lendária “boquinha da garrafa” e assemelhados – e
sambas-de-enredo-de-escritório, compostos por dezesseis mãos, nos quais
pontificam refrões onde as palavras folia/magia/fantasia sempre se
apresentam em rimas previsíveis/sofríveis/descabíveis.
Particularmente, nos desfiles das
escolas de samba de hoje, os grandes panteões vivos das agremiações
tradicionais – as Velhas Guardas dos Compositores - ocupam, simbólica e
sistematicamente, a última posição no préstito, num carro alegórico sem
nenhuma pompa, fora dos focos dos flashes, eles que durante décadas
formavam o eixo do desfile, a partir da criação de sambas-de-enredo
magníficos. Tornaram-se meros coadjuvantes da festa, já que os
protagonistas da atualidade são os carnavalescos…Triste Fim de Policarpo
Quaresma, como já escrevera e prevera Lima Barreto…