“Se eu quiser fumar eu fumo/se eu quiser
beber eu bebo/pago tudo o que consumo com o suor do meu emprego…”, já
cantava Zeca Pagodinho no começo dos anos 90, ele, que no despontar da
carreira, tinha que se esquecer do almoço pra poder jantar. Questão de
dose, como sempre, nesta vida.
Do Maranhão vem a receita em licitação: 80 quilos de lagosta, 1000
quilos de camarão, 2000 quilos de pescada. Haja dose, empanturrados
ensarneyzados de frutos do mar. A diferença simples em relação aos
versos do Zeca Pagodinho é que, no caso, esta turma do poder maranhense
consome tudo isso sem ter que suar pra consumir, vem tudo na faixa, cai
na conta do trabalhador, que paga o maior conjunto de impostos do mundo
para ter um dos piores serviços do mundo, em todas as áreas, inclusive
na segurança presidiária catastrófica recém-anunciada naquelas bandas.
Paracelso, alquimista suíço, nos legou uma máxima, inquestionável,
desde o século 17: a diferença entre a cura e o vício é a dosagem da
droga. E ele tem razão, mesmo passados mais de trezentos anos, continua
atualíssima. A questão, em qualquer situação, é se identificar a droga
e, por extensão, administrar a sua dosagem. Cigarro, cachaça, celulares
inteligentes, futebol com cinco volantes de contenção, novelas, reality
shows, governantes, drogas estão por aí em milhares de opções, é só
escolher. Após escolha – e aí vem o foro íntimo individual – segue a
parte mais difícil, acertar a dose de consumo da droga escolhida, de
forma a não se tornar vício.
Um maço ou dois de cigarros diários, três copos ou meio litro de
cachaça por balcão de bar, vinte e quatro ou vinte e cinco horas
conectados aos aipodis? Assistir a todos os programas de debates sobre
futebol, além dos treinos do time do coração, se programar para jantar
nos intervalos das novelas pra não perder nada dos capítulos, pagar no
pay-per-view para bisbilhotar os brothers e sisters até de madrugada,
votar mal e votar mal novamente nos mesmos governantes que prometem e
nada fazem, a não ser protagonizarem cenas de fisiologismo e corrupção?
É, acertar essa dosagem não é tarefa das mais fáceis, ainda mais porque a
vizinha, o colega de trabalho e o padeiro, o tintureiro e o marceneiro
podem lhe induzir a ajustar a sua dose em função da dosagem alheia.
Até na música essa abordagem “paracelsica” cabe, é só contabilizar o
número de carros que nos agridem diariamente com música (?) estridente
envolvida em letras apelativas e melodias inexistentes, só que neste
caso há descumprimento da constituição, pois nós como transeuntes não
precisaríamos estar consumindo as drogas dos que estão no volante dessas
discotecas ambulantes. Caso jurídico para ser resolvido em primeira
instância, sem direito a liminares e embargos infringentes. Senão vicia…